segunda-feira, 15 de março de 2021

AS LÁGRIMAS DE MARÇO

  (FRAGILIDADE DA VIDA)

(Mata Atlântica – ES)

O vírus corona não brinca em serviço. Só no Brasil, ele tem deixado, diariamente, mais de duas
mil famílias chorando a perda de entes queridos. No mundo todo já são computados mais de dois milhões e seiscentas mil mortes entre março/2020 e março/2021.

Sabemos que o vírus é afeito a aglomerações e a pessoas mais maduras. Fugir de sua primeira preferência é possível, mas da segunda não há escapatória. Os idosos são mais vulneráveis. O vírus deve conhecer as leis da natureza: frutas maduras caem com maior facilidade que as verdes.

Na impossibilidade de fugirmos da idade cronológica, meu marido e eu nos afastamos de aglomerações. Nosso confinamento já completa um ano, na Mata Atlântica. Há mais aspectos positivos que negativos nesse confinamento rural: friozinho montanhês em pleno verão, caminhadas ecológicas sem uso de máscara, ar puro, cheiro de mato, entorno com mil tons de verde... mas falta gente, falta movimento, falta calor humano.

Fazemos cotidianamente uma caminhada matinal de uma hora, em torno do lago mais próximo. Todos os dias eu observava três frágeis plantinhas que vingaram em ambiente inóspito. Brotaram do nada, num lugar altamente vulnerável, sem condições propícias para seu desenvolvimento. Na boca de escoamento da represa, lá estavam elas, tímidas e insignificantes, diante da magnificência da mata e ao sabor dos ventos.  Todas as manhãs, saudava-as com o olhar benevolente e cúmplice, como se tivéssemos algo em comum. 

Sempre que as observava, refletia sobre a vitalidade e a efemeridade dos viventes, incluindo o reino vegetal. As três plantinhas demonstravam concomitantemente a pujança da vida em ambientes adversos e sua vulnerabilidade diante dos fenômenos da natureza. Houve uma forte tempestade. O rego d’água que bordeja nossa casa se transformou em córrego caudaloso, com sérias pretensões de chegar a rio.  Todo o fluxo aquoso desceu pela vertente rumo ao lago, no fundo do vale. Houve queda de árvores centenárias e, evidentemente, queda de energia elétrica, fato frequente onde a fiação coexiste com árvores frondosas.

 Na manhã seguinte, sob céu azul e tímido sol montanhês, saímos para a habitual caminhada e para um banho de sol. Desolada, constatei que o transbordamento da represa havia levado, de roldão, as persistentes plantinhas, que teimavam em existir. Ontem, lindas e viçosas; hoje, inexistentes. Durante a pandemia, estamos tão vulneráveis quanto elas. A enxurrada do coronavírus tem sido impiedosa. Não podemos fazer planos futuros. Não sabemos se haverá futuro.

Minha irmã Rosária até pouco tempo saudável e venturosa, cercada por filhos e netos, também foi levada de roldão, como aquelas plantinhas, não pelo excesso de H2O (água), mas pela carência de O (oxigênio). Seu caso covídico foi rápido e fulminante. Sentiu os primeiros sintomas numa sexta-feira, foi internada na segunda e nos deixou para sempre, na noite de terça-feira, sem tempo de dizer adeus. Poucos dias antes ela havia perdido dois netos, ainda jovens, que trabalhavam na área da saúde. Poucos dias depois, foi a vez de seu filho caçula fazer companhia (não por solidariedade) aos que haviam partido antes dele. Tenho motivos de sobra para estar enlutada e lacrimosa. Hoje perdi mais uma pessoa da família. É a décima, em cinco meses, ou seja, uma média de novo luto a cada quinzena. A tragédia mundial se estampa o tempo todo na mídia. Evito emissões televisivas, jornais e revistas. A tensão está no ar. As vacinas, até agora, têm chegado a passos de tartaruga, apenas para os mais vulneráveis: idosos acima de 80 anos e trabalhadores da área da saúde. Ainda não se sabe se haverá vacina para todos. Estando os mais idosos vacinados ou mortos, evidentemente o perfil das vítimas vai mudando. Poderá haver carência de vacinas e vírus de sobra.

Há um ano, estamos vivendo o pesadelo de não saber se estaremos vivos dentro de um mês, de uma quinzena ou de uma semana. No entanto, a Mata Atlântica, indiferente às lágrimas “de março fechando o verão” de 2021 e a tudo que se passa com seus habitantes da raça humana, permanece majestosa e esplendorosa. De meu refúgio, admiro sua exuberância em cambiantes matizes verdejantes e fico “matutando”: mais dia, menos dia, pereceremos todos, enquanto ela permanecerá impassível e viçosa. Diferentemente de nós, mesmo destruída pelo fogo ou pelo desmatamento, a Mata é resiliente. Com o tempo, retoma sua forma original e seu lugar ao Sol, malgrado as intempéries, as alterações e os infortúnios.

Jô Drumond

12 de março de 2021


RETORNO DOS LEITORES 

 

JOSÉ HUMBERTO FAGUNDES – PRETÓRIA – AFRICA DO SUL

Li e gostei tanto que me inspirei em “Lágrimas de março”. Pena que meu texto ainda esteja inconcluso. De volta “às lágrimas”, parecia que flutuava pela Mata levado por suas mãos, melhor por sua narrativa, o que resulta no mesmo. Entristeci-me por sua irmã e por todas as perdas da família. O luto tão próximo aos afetados diretamente alcança escala global. A solidariedade, espero, amplia-se também na mesma escala diante da tragédia. O seu texto é um louvor à natureza e à valorização da vida. Para revigorar qualquer um, como se fôssemos tão resilientes quanto a floresta.

Um brinde a você e ao “Viveiro do silêncio”!

Saúde, dear Jô!

 

MARIA DAS DORES ARAÚJO (DÔTE) – BELO HORIZONTE - MG

Demorei, mas vivi o encantamento de ler “As lágrimas de março “

Envolvida em cuidados com o marido convalescente, fui adiando. Aliás, para ler suas crônicas, prefiro estar com a alma limpa, mente desocupada, sem risco de ser interrompida.

E assim, saboreio seus deliciosos escritos.

Um beijo grande para vocês dois.

 

EDUARDO BAUNILHA – SERRA - ES

Um relato pessoal recheado de dor e poesia. Um apelo à vida, um drible na morte, com esperanças bem sutis, mas verdadeiras. Você é sempre surpreendente.

 

MARIA DA PENHA – MATHILDE - ES

Muito bom! Só aquele que vive verdadeiramente as nuanças do dia à dia, com empatia em relação a tudo e a todos, é capaz de escrever texto tão sensível e, embora triste, incrivelmente belo. Lamento a perda de seus afetos.

 

REGINA MENEZES – VITÓRIA - ES

Só hoje pude ler novamente AS LÁGRIMAS DE MARÇO. Não consegui comentar no blog e por isto falo por aqui.  Texto bem escrito, denso e muito triste. Sentimos logo no título.

Um dia de sol ou de chuva nem sempre é prenúncio de dias felizes nesse mês das lágrimas, como você retrata muito bem:

“Desolada, constatei que o transbordamento da represa havia levado, de roldão, as persistentes plantinhas, que teimavam em existir.... Durante a pandemia, estamos tão vulneráveis quanto elas”.

Assim é a vida. Uma enxurrada que nos leva impiedosamente em direção a um futuro incerto é desconhecido.

E agora? Não temos vacinas suficientes e os jovens adoecem comprometendo os idosos, mais vulneráveis.

Parabéns pela obra!

Sentimentos pelas perdas sentidas.

 

ADRIANA – VITÓRIA - ES

Como sempre, uma crônica de tirar o fôlego (literalmente).

Realmente são dias sombrios e incertos. Mas somos como a Mata... RESILIENTES.

Meus sentimentos por suas perdas e meu abraço simbólico com muito carinho.

Venceremos... vai dar tudo certo!!!

 

AGDA PIMENTEL – BELO HORIZONTE - MG

As Lágrimas de Março. O inusitado, que jamais pensamos que viveríamos e que seria tão intenso...cada um em sua casa, consigo mesmo...

Parabéns por esse testemunho rico do que está sendo esta quarentena. Grande abraço. Fique com Deus

 

JÚLIA CARVALHO – VITÓRIA - ES

Jô querida. Saudades mil!!!

Apesar da tristeza do momento, senti no fundinho do meu coração um pouco de alegria ao ver de relance, que havia crônica sua pra eu ler. “As Lágrimas de março” é um retrato fiel de nossa caminhada há mais de ano. É colocada de forma natural, a nossa finitude.

Fico também “matutando “de como é prazeroso ler seus escritos, independentemente do tema.

 

DANILO TEIXEIRA – PATOS DE MINAS - MG

amei fazer a leitura dos seus contos, Tia Jô!

Muito obrigado por compartilhar!

Não vejo a hora de podermos reunir toda a família e celebrar a superação dessa fase difícil.

Grande abraço

 

AZIMAR – VITÓRIA - ES

Choramos as mortes e louvamos a Mata Atlântica em seu esplendor, cantada em versos e prosas, e fotos, desta sua admiradora escritora e poeta, Jô Drumond em "As lágrimas de março". 

Parabéns pela milésima vez.

Abraço!

 

GLÓRIA OLIVIERI CAIXETA – BRASÍLIA - DF

Jô querida, você tem mil razões para estar lacrimosa. Estamos! Impossível permanecer indiferente a tudo que vivemos nesse último ano. Uma dor se insinua companheira, difusa, amargando nossos dias.

Aprecio que você converta seus sentimentos em crônica, é um jeito de se salvar. Bj

 

MARIA INEZ NASCIMENTO  AMORIM – LAGOA SANTA - MG

Jô li seu artigo, bonito e triste ao mesmo tempo. Fiquei pesarosa com tantos lutos em sua família, e esperançosa, com o renascer da natureza, que acontece sempre, apesar de nós, humanos, e nos dá uma lição de resiliência, para enfrentarmos esta crise. Temos que nos esforçar para continuar lembrando que a vida é bela, e que ainda estaremos aqui por um bom tempo. “Esperança” é a palavra-chave. Creio que o fato de escrever a crônica deve ter te ajudado neste momento difícil, e irá te ajudar sempre. Do seu cantinho lindo aí na mata, coisas lindas também vão brotando. Um abraço carinhoso.

 

ÂNGELA XAVIER – OURO PRETO - MG

Jô, muito triste a situação em que estamos. Meus sentimentos pela perda de seus familiares.

Eu tb estou em casa. Entre Ouro Preto e a Caieira, esperando que está situação passe logo.

 

GILSON TEIXEIRA – UBERABA - MG

Linda crônica, verdadeira, mas pesada aos olhos e ao coração. Na verdade, os fatos são assim, chocantes, como descritos em sua crônica. Precisamos estar atentos a eles. Vou aguardar para ler sua próxima crônica com pensamentos positivos e alegres. Será uma boa maneira de amenizar tanta dor.

 

SÔNIA ROSSETO – VITÓRIA - ES

Olá Jô! Meus sentimentos pelas perdas de seus entes queridos. Eu tb ando com o coração apertado, não tanto quanto o seu. Também, em 15 dias, foram dois de volta para a casa Paterna. 

Gosto muito da sua sensibilidade de escrever e de descrever a natureza de uma forma tão delicada. Parabéns! Deus conforte seu coração e de sua família!

 

SOÊMIA – VITÓRIA - ES

Muito lindo este seu texto,  querida amiga 🙏.

Não sabia que você tinha passado por tantas perdas.

Meus sentimentos, querida 💓

Meus parabéns por mais uma de suas belas crônicas.

Sou sua fã de carteirinha😘🌹🙏💕👏👏👏

 

 

WANDA ALKMIN – VITÓRIA - ES

Bom dia, amiga!! Muito linda e sensível, sua crônica.

Meus sentimentos por tantas perdas.

Pra mim, você é uma mistura da plantinha que persiste ao meio da água brava, é árvore frondosa na fértil mata e voo de colibri, leve a voar no azul do céu.

Tenha um dia cheio de luz e paz.

 

ELIANE REIS E SILVA– NATAL - SERGIPE

Jô querida, muito obrigada, adoro tudo que você escreve. Meus sentimentos, pela grande perda dos teus entes queridos. Deus te abençoe. Bjão

 

JAÇANAN -VITÓRIA - ES

Muito triste essa realidade que estamos vivendo. Seu artigo, como sempre, nos faz pensar sobre tudo o que estamos passando. Um abraço.

 

MARIA DO SOCORRO TERTO – TEREZINA - PIAUÍ

Bom dia. Jô querida, só agora, de manhã, pude ler “As lágrimas de março”. Muito bem escrito, mas que muito me abalou, em referência a sua família. Esta peste chegou e massacrou todas as famílias. Realmente vivemos de incertezas em relação a ela. Hoje estamos bem, amanhã já podemos estar atacados. Vamos ter esperança de que Deus dê uma pausa com sua misericórdia divina, e possamos ter força e fé nesta caminhada da vida. Muito bem escrito seu texto,  vc é  uma bela escritora. Bom dia! Bj

 

MARIETA APARECIDA – BELO  HORIZONTE - MG

Meus sentimentos pela perda de mais um membro de sua família! Já virou um pesadelo, essa doença, assim como a falta de visão do ser humano que se expõe à aglomeração e que não acredita no perigo desse momento que estamos todos vivendo!

Respeito, palavra mencionada em todas as plataformas; mas cabe a cada um compreender seu significado em todos os âmbitos. Somente assim, o homem compreenderá a ação necessária para frear a pandemia da ignorância.

 

MARIA LÚCIA – VITÓRIA - ES

Linda crônica. Comovente e triste, nos faz pensar quão frágil é a vida.

Todos nós estamos perdendo pessoas queridas. Que Deus nos ajude a passar por esse furacão. Um grande e saudoso abraço

 

MARIA JOSÉ FONSECA – BRASÍLIA – DF

Muito bom seu artigo, amiga. Mas não resisti. Como você  é  forte! Que bom que Deus lhe deu sabedoria para superar e lhe escondeu do perigo num cantinho maravilhoso! Receba de coração meu abraço solidário.  💋💋💋💋