quarta-feira, 12 de dezembro de 2018

O NATAL E A IDADE DOS PORQUÊS


Atendendo à solicitação da campanha “Faça uma criança feliz”, em prol do Natal das crianças carentes, pedi a um dos meus netos que me ajudasse a separar os brinquedos com os quais ele não brincava mais, ou raramente brincava, para doá-los às crianças pobres.

- Por que você quer doar meus brinquedos, vovó?

- Porque crianças pobres não têm brinquedos.

- Existe criança sem brinquedo?

- Sim, infelizmente.

- Por que elas não têm brinquedos?

- Porque são pobres.

- Por que elas são pobres?

- Porque seus pais não têm dinheiro

- Por que eles não têm dinheiro?

- Talvez estejam desempregados... não sei bem... Venha, ajude-me a colocar esses aqui na sacola.

Tentei interromper os questionamentos, desviando sua atenção, em vão.

- Mas escuta, vovó: para onde você vai levar esses brinquedos?

- Vou entregá-los a algumas pessoas que estão fazendo uma campanha para o Natal das crianças pobres.

- Mas no Natal não precisa, vovó. Papai Noel é bonzinho! Ele traz presentes pra todo mundo.

- Sim, eu sei, mas, por exemplo, você tem muitos brinquedos e ganha ainda mais, no Natal. Não há mais espaço em seu quarto, para guardá-los. As crianças pobres também certamente vão ganhar, mas como têm poucos brinquedos, há mais espaço em suas casas.

- Vovó, as crianças pobres também vão à creche?

- Sim, certamente.

- Então elas devem ter brinquedos na creche.

- Pode ser, mas as creches em bairros pobres têm menos brinquedos. Vamos fazer uma coisa? Vamos ao playground brincar de pula-pula?

- Ôba! Vamos agora?

- Sim, é pra já!

Dessa forma, livrei-me da sequência do interrogatório. Sabe-se que, na idade dos porquês, a criança começa a despertar para o entendimento das coisas. Passa a observar e a perceber os fatos que acontecem em seu entorno, e se põe a questionar repetidamente, com uma série de porquês. É próprio da idade, e é importante que assim seja. Ela passa a ter percepção mais aguçada e começa a descobrir a si mesma e ao mundo. Trata-se de uma curiosidade benfazeja que a levará a novas descobertas.

Ao voltar do playground, eu já nem pensava mais na razão que nos havia levado até lá. Ele, no entanto, continuava atento. Abriu um armário cheio de brinquedos e me disse.

- Vovó, pode levar todos os meus brinquedos para as crianças pobres.

Tive que me controlar para conter as lágrimas.

Jô Drumond