quinta-feira, 26 de maio de 2016

A GALINHA SAPATÃO

*Jô Drumond

No pequeno galinheiro de Aldemar, em Patos de Minas, há apenas galinhas poedeiras, para o consumo familiar. Todos os dias, no mesmo horário, ele alimenta as aves e recolhe os ovos. Como não há interesse em aumentar a população do galinheiro, dispensa-se a presença de galo. 

Certo dia, sua mulher lhe perguntou se ele havia comprando ovos caipiras. Mediante resposta negativa, ela lhe perguntou se ele havia colocado galo no galinheiro. Mediante segunda resposta negativa, ela ficou bastante intrigada. Algum galo estava pulando a cerca do quintal, ou seu marido estava mentindo. 

O fato é que os ovos estavam todos galados. Aldemar não acreditou. Pensou que fosse invencionice de sua mulher. Ela lhe provou que estava certa. Os ovos poderiam ser chocados. A partir de então, ele passou mais tempo observando o galinheiro, na esperança de flagrar algum galo pulador de cerca. Para seu espanto percebeu que uma das galinhas fazia a corte às demais e com elas copulava. Observou com mais atenção a dita galinha. Percebeu que ela tinha a cabeça um pouco maior e o pescoço um pouco mais grosso que o normal. Tratava-se de um macho, num corpo de fêmea, fato raro, mas já ocorrido em outros quintais.

Essa questão pode nos remeter ao homossexualismo, ao bissexualismo, ao transexualismo, e a outros “ismos” que porventura possam existir, referentes ao sexo nos humanos. Tudo o que os moralistas consideram imoral e que os religiosos consideram pecado nada mais é que fato orgânico, fisiológico, natural.

Desde sempre a humanidade conviveu com diferentes preferências sexuais lícitas ou ilícitas, segundo as convenções sociais de cada época. Na Grécia antiga, por exemplo, a homossexualidade masculina era vista com naturalidade.

Nota-se que a homo afetividade nos humanos se apresenta em diferentes graus. Há os que não aparentam nenhum traço distintivo; outros têm discretos trejeitos ou leve impostação vocal, que não chegam a ser notórios; há ainda os que são facilmente identificáveis pelo andar, pelo modo de sentar, pelos gestos, pela voz, pelo olhar, enfim, pelo jeito de ser. Há também os que têm aparência explícita, mesmo estando estáticos ou silenciosos. Por mais que disfarçassem, jamais conseguiriam esconder sua homossexualidade.

Donde se pode inferir que o grau de feminilidade masculina assim como o de masculinidade feminina dependem  simplesmente da dosagem hormonal em cada organismo. Faz parte da natureza. Portanto é natural. A galinha não age como galo por opção própria, mas devido à sua condição orgânica.
Assim, em vez de condenar os “homo-bi-transexuais”, os moralistas e os preconceituosos  devem respeitar o modo ser de cada um e aceitar o fato com naturalidade. 


*Jô Drumond (Josina Nunes Drumond)
Membro de 3 Academias de Letras (AFEMIL, AEL, AFESL)e do Instituto Histórico (IHGE