Certo dia, telefonaram-me
solicitando o trabalho como professora num convento da Ordem das
Carmelitas, “as servas dos pobres”. Eu deveria ensinar a língua francesa a duas
irmãs que iriam para o Mosteiro de Nossa Senhora do Monte Carmelo, fundado no
século XI, em Israel, no qual se usa esse idioma para as orações.
Fiquei
curiosa. Eu nunca havia visto uma carmelita, pelo fato de viverem
enclausuradas.
Eu teria que me deslocar todos os
dias até o convento, e enfrentar o trânsito do centro da cidade, num percurso
que duraria, no mínimo, uma hora de ida e outra de volta. Tive que recusar o
convite, devido a outros compromissos assumidos anteriormente.
Dias depois, recebi outro
telefonema. Como o tempo urgia, o convento decidira abrir uma exceção. Elas
poderiam se deslocar até minha casa, para o aprendizado. Um dos voluntários,
que ajudavam a ordem, havia se oferecido para levá-las de carro. Esperaria estacionado
à porta, e as levaria de volta, sãs e salvas.
A mais jovem era alegre, sorridente e
brincalhona. A outra, séria e compenetrada. Duas personalidades totalmente
opostas. Com o tempo, percebi que a convivência entre elas não era de todo
pacífica. Frequentemente, a mais idosa policiava e repreendia, com o olhar, as
atitudes espontâneas da mais jovem.
Ambas usavam o tradicional e incômodo
hábito escuro, mantendo apenas o rosto à vista, vestimenta imprópria para
aquele verão escaldante. Num dia de altas temperaturas, eu usava uma blusa
branca em tecido fino, transparente, sobre uma camiseta de alças. Encalorada,
pedi licença, tirei a blusa em plena aula e lhes disse que ficassem à vontade
para se livrar de tantos panos. Não sei se eu disse alguma besteira. O fato é
que elas riram descontraidamente. A mais jovem disse: Ah! Como você é
engraçada! Quando eu contar isso para as outras irmãs elas nem vão acreditar!
Ficamos amigas, na medida do
possível. Nossos encontros linguísticos eram muito prazerosos. Elas estavam
ansiosas para aprender falar e rezar em francês. Elas diziam que eu era um anjo
caído do céu, para lhes ensinar a língua que usariam no convento, em Jerusalém.
Aos poucos, a notícia se espalhou
pela vizinhança. Nos horários de aula, minha casa parecia ponto turístico.
Discretamente, todos queriam ver, mesmo de longe, por instantes, as duas
“desenclausuradas”. Os curiosos se mantinham discretos, para não assustá-las.
Alguns fingiam estar varrendo a calçada, outros passeando com o cachorro ou
lavando o carro. Havia também aqueles que se disfarçavam dentro dos carros, de
modo que elas não se sentissem foco das miradas.
Certo dia elas me disseram que as
pessoas, em geral, são extremamente bondosas, gentis e generosas. Prova disso é
que no convento, elas vivem da caridade alheia, sem necessidade alguma de pedir
algo a quem quer que seja. O padeiro fornece-lhes gratuitamente o “pão de cada
dia”; o açougueiro faz-lhes a estocagem semanal de carnes; os feirantes são
pródigos em frutas e legumes; o merceeiro também fornece sua cota semanal.
Assim sendo, nada lhes falta. Perguntei-lhes se o motorista as conduzia também
gratuitamente, até minha casa. − Claro que sim, disse a mais jovem. Ele é
um amor de pessoa! Está com a mãe muito doente e pede sempre que oremos por
ela.
Num piscar de olhos matei a charada
de tanta generosidade. Tanto o padeiro, quanto o açougueiro, o verdureiro, o
merceeiro e os demais que atendem às necessidades básicas do convento são
recompensados por orações. Há uma crença de que a oração de uma Carmelita vale
mais que a do cidadão comum, pelo falo de ela estar quase sem contato com o
mundo, em estado de graça e, por conseguinte, mais perto do céu. É como se
tivesse linha direta com o Criador. Seus pedidos são mais facilmente acatados
pela divindade. Essa intermediação é o preço pago por elas aos generosos
voluntários, todos eles com graves problemas na família, a serem resolvidos,
sobretudo de saúde.
Delicadamente, fiz–lhes ver, com
muita cautela, para não decepcioná-las, que o mundo e o ser humano não são tão
bons, nem tão generosos quanto parecem. O que se faz em prol do convento é uma
simples permuta: provisões em troca de orações.
JÔ Drumond




A resposta é simples. Os vestidos, geralmente, são de chita, por ser um dos tecidos mais baratos, usados por camponeses. O modelito típico feminino de mangas curtas e saia rodada é originário de uma festa campesina, no hemisfério norte, para comemorar o solstício de verão, ou seja, o dia mais longo do ano, que, contrariamente, em nosso hemisfério, coincide com o solstício de inverno.
s boas colheitas. Mais tarde, o cristianismo transformou a festa pagã, que já acontecia nessa data, em festa religiosa, aproveitando o ensejo da data natalícia de São João. O termo original “joanina” foi posteriormente substituído por outro mais abrangente, “junina”, para abarcar outros santos cujas festividades acontecem no mês de junho (São Pedro e Santo Antônio). Como muitas vezes, no Brasil, as festividades se estendem pelo mês de julho, eventualmente ouve-se até mesmo “festa julina”. A flexibilidade linguística nos permite tais adaptações.
Os balões, hoje proibidos no Brasil devido ao risco de incêndio, sobem aos céus para anunciar o início das festividades. A explosão dos fogos de artifício, segundo a tradição, é para acordar São João. O mastro atual, com três bandeirolas na extremidade superior, é uma homenagem aos três santos. A fogueira, símbolo de proteção contra maus espíritos, nocivos à colheita, faz parte das comemorações, desde a Idade Média. O casamento caipira é uma sátira aos casamentos tradicionais.
No Brasil, a quadrilha se tornou uma tradição, nas festas de junho. Praticamente nos quatro cantos do país, ela acontece em clubes, praças e escolas (desde as creches até as universidades). O interessante é que, na França, onde se fixou tal tradição, ela inexiste nos dias de hoje. O divertimento popular ao ar livre, herdado por nós, acabou descambando para o can-can. Salvo engano, a única quadrilha popular que resta em terras gaulesas, é numa possessão francesa, a ilha da Córsega.

