*Jô Drumond
Sabe-se que o muro de
Berlim, erguido em 1961 pela União Soviética, conhecido também como “O
muro da vergonha”, dividiu a Alemanha durante 28 anos. Atualmente, há um
contrassenso generalizado a respeito de barreiras internacionais. Por um lado,
louva-se a queda do muro de Berlim, ocorrida no final da década de 90. Por outro,
constroem-se mais e mais muros ou cercas fronteiriças, com o intuito de evitar
a migração e de aumentar a segurança da população. Segundo consta, há
atualmente uma extensão de edificações de barreiras nacionais quatro vezes
superior à do muro de Berlim, ou seja, 40.000 quilômetros, sendo que a metade
ainda se encontra em obras.
A Hungria construiu
uma cerca de quatro metros de altura, ao longo de 170 quilômetros de fronteira
com a Sérvia. Israel também ergueu barreira para evitar infiltração de terroristas
da Cisjordânia e planeja proteger-se do Estado Islâmico, fechando, da mesma
forma, a fronteira com a Jordânia. O Quênia, a Arábia Saudita e a Turquia
seguem o mesmo exemplo. Nos Estados Unidos, cogita-se, por motivos
eleitoreiros, a construção de cerca de três mil quilômetros na fronteira com o
México. Não sabemos até quando isso vai durar, nem a que proporções chegará esse
tipo de atitude defensiva.
A meu ver, seria mais
enriquecedor considerar a migração sob uma ótica positiva. Os que são contra
alegam a facilitação de atos terroristas e o grande afluxo de foragidos de
guerra. Nesse caso, em vez de interferir nos processos migratórios, seria
melhor criar eficientes mecanismos para coibição do terrorismo e para
assentamento das famílias que buscam condições dignas de vida.
Ultimamente duas
notícias chocantes trouxeram à baila a discussão referente à imigração e à criação
de impedimentos migratórios: a morte de 71 refugiados encontrados asfixiados
dentro de um caminhão, na estrada entre Budapeste e Viena, e a imagem estampada
em jornais e revistas do mundo todo, de mais uma vítima dos inúmeros naufrágios
de embarcações repletas de refugiados. A imagem do garotinho sírio, Aylan, cujo
corpo emborcado, como se estivesse dormindo, numa praia da Turquia, emocionou a
todos.
Na revista Veja
de 02 de setembro de 2015, foi publicada, por Nathalia Watkins, uma matéria
reflexiva sobre o assunto, intitulada “A multiplicação de barreiras”, na qual
há um relato sobre esse recente tipo de edificação.
Tal constatação nos
deixa perplexos, visto que a era da globalização deveria primar pela abolição
de todo e qualquer tipo de barreira, seja política, econômica, religiosa ou
cultural. Ao contrário, criou-se uma insegurança generalizada no que se refere
à perda da identidade e da soberania nacional. Segundo o sociólogo inglês Frank
Laczko, o que mais aflige os povos em geral, hoje em dia, é a sensação de
vulnerabilidade, devido à falta de controle em zonas fronteiriças.
Contrariamente à
acepção usual de fronteira como delimitação ou zona de conflitos, em Semiótica
da Cultura define-se fronteira como lugar culturalmente muito rico, onde
sistemas culturais completamente diferentes se inter-relacionam e interagem Nas
manifestações culturais contemporâneas, nota-se certa tendência ao
esfacelamento das fronteiras e ao fortalecimento do hibridismo cultural
(sincretismo, mestiçagem, crioulismo etc). Não se trata, no entanto, de mescla
ou fusão e sim da convivência de elementos alógenos e heterogêneos. Por
analogia, na culinária, os vários condimentos, combinados diferentemente,
produzem novos sabores, mantendo cada um seu sabor original. Dessa forma,
diferentes culturas, em contato umas com outras, se expandem e se enriquecem,
sem perder seus traços distintivos.
Segundo a matéria
acima mencionada, pesquisas acadêmicas mostram que, contrariamente ao que se
supõe, nos Estados Unidos “a taxa de pessoas ativas entre os imigrantes é
mais alta do que no resto da população”, donde se conclui que a imigração não é
tão prejudicial ao país quanto parece. Pode ser até benéfica, pois os
imigrantes se encarregam normalmente de tarefas e serviços mais pesados e
difíceis, “les taches pénibles”, poupando assim os nativos dos encargos
indesejados.
É interessante
observar que a fortificação de fronteiras remonta a 220 anos a.C., época em que
foi iniciada a grande muralha da China, com o intuito de evitar ataques dos
hunos. No medievo, as cidades e os castelos eram fortificados para resistir a
ataques inimigos.
Thomas Hobbes
(1588/1679) tinha razão ao afirmar: “o homem é o lobo do homem”. Em outras
palavras, no afã de usar seu poder para se
autopreservar e para satisfazer seus desejos, o homem está prestes a guerrear,
mesmo sem causa aparente.
*Jô Drumond (Josina Nunes Drumond)
Membro de 3 Academias de Letras
(AFEMIL, AEL, AFESL)e do Instituto Histórico (IHGES