quarta-feira, 11 de fevereiro de 2015

PROBLEMAS E CURIOSIDADES DA LÍNGUA PORTUGUESA

O livro Problemas e curiosidades da Língua portuguesa, do Dr. José Augusto Carvalho, deveria fazer parte de todas as bibliotecas públicas, privadas e particulares. Deveria também ser livro de cabeceira dos estudantes, dos que utilizam a palavra como ferramenta de trabalho, como jornalistas e advogados, assim como dos escritores e poetas, que se comprazem em trabalhar com palavras, para deleite próprio ou para o de seus leitores. Trata-se de uma obra abrangente, destinada a um público amplo e heterogêneo, cujo idioma vernáculo é a “última flor do Lácio, inculta e bela”.
A maioria dos artigos nela contidos foi publicada numa coluna semanal do Jornal A Gazeta, entre 2006 e 2009.

O renomado autor dispensa apresentação, mas faz-se mister ressaltar sua atuação como professor da Ufes (por mais de meio século), como incansável pesquisador, e como ensaísta,  cronista, contista, romancista e tradutor. Doutor em Letras pela USP, dedicou sua vida ao ensino da língua pátria no Estado do  Espírito Santo, onde reside há mais de sessenta anos, oriundo de Minas Gerais.
Publicou 2 romances,  3 livros de crônicas, 3 de contos 4 sobre a língua portuguesa. Publicou também inúmeros artigos sobre língua e literatura em jornais e revistas especializadas. Traduziu vinte livros (do italiano, do francês e do inglês) para as editoras Record, Bom Texto e Cátedra.
O livro em questão, Problemas e curiosidades da íngua portuguesa, contém cerca de quatrocentas páginas, que são verdadeiras lições do vernáculo, propícias a todos os brasileiros e aos lusófonos em geral. Além de tirar dúvidas recorrentes, apresenta inúmeras curiosidades de nossa língua, de modo interessante e bem–humorado. Trata-se de um imprescindível livro de consultas, com leitura leve e agradável.

O autor aborda a importância da língua culta como instrumento de ascensão social, as normas em documentos, a nova ortografia, a redação escolar... Dá diversas dicas para quem escreve,  aponta erros generalizados e/ou interessantes, equívocos vocabulares e “cochilos” de quem escreve.
Em “Erros generalizados”, descobrimos que é  incorreto dizer “vou sair às dez para as nove”. Deve-se dizer “vou sair aos dez para as nove” (aos dez minutos).  Segundo ele, há formas inadequadas tão habituais, que estranhamos ao ouvir a forma certa.  A partícula de exclusão ou advérbio “sequer”, significa “ao menos” ou “pelo menos”. Ex.: faria o trabalho, se me dessem sequer uma oportunidade. É incorreto dizer “ele sequer pagou o almoço”, no sentido negativo. O correto seria “ele nem sequer pagou o almoço”. A locução adverbial “nem sequer” forma a negação.
Em “Equívocos vocabulares”, ele cita a locução conjuntiva “posto que” (sentido concessivo =embora), usada erroneamente, sobretudo em textos jurídicos, no sentido causal (porque). Outro equívoco: festas juninas (de junho), realizadas em julho deveriam ser festas “julianas” e não “julinas”, como têm sido chamadas, por analogia a junina.
Quanto aos “Cochilos de quem escreve”, o autor alerta aos profissionais da palavra , a fim de que releiam atentamente seus textos, para evitar deslizes tais como nestes avisos paroquiais: “... começará a catequese para meninos e meninas de ambos os sexos”; “o coro de maiores de sessenta vai ser suspenso durante o verão, com o agradecimento de toda a paróquia”;  “estimadas paroquianas: não esqueçais da beneficência! É uma boa altura para vos livrardes de coisas inúteis que tendes em casa. Trazei vossos maridos”.

Um ponto forte da obra concerne às particularidades linguísticas. O autor explica detalhadamente o emprego de locuções que sempre confundem a todos: Em vez de / ao invés de; há cerca de / acerca de / a cerca de;  ao encontro de / de encontro a / a par de / ao par de;  a fim de / afim;  através de / por meio de;  na medida em que / à medida que;   se não / senão;  tampouco / tão pouco;  a princípio / em princípio; abaixo / a baixo;  próximo a / próximo de, entre outras.
Aficionado à origem das palavras, José Augusto focaliza etimologias interessantes, como a de “forrobodó”, falsas, como a de “esculpido e encarnado / esculpido e escarrado, improváveis, como a do termo “religião”,  atribuída seja ao verbo religar, seja ao verbo reler, e etimologias populares, sem respaldo científico: “Sam” (de tio Sam); “etiqueta”; “carnaval”...
Nesta concisa demonstração da amplitude e da relevância dessa obra, é impossível enumerar os importantes e/ou interessantes ensinamentos nela registrados. Cabe ao leitor descobri-los a seu bel prazer.
*O livro só pode ser encontrado no site da editora editor@thesaurus.com.br - www.thesaurus.com.br


Jô Drumond é escritora e membro da: AEL (Academia Espírito-santense de Letras). AFESL (Academia Feminina Espírito-santense de Letras) AFEMIL (Academia Feminina Mineira de Letras) IHGES (Instituto Histórico e Geográfico do ES).

segunda-feira, 1 de dezembro de 2014

ASAS QUEBRADAS

Por Jô Drumond

A ampulheta se esvazia
a certeza se enche de dúvidas
meus versos se descompassam
na arritmia do coração
Quanto tempo me resta, doutor?
Como dissipar meu desassossego?
Tenho pressa em descobrir o mundo
prenderei meus anseios dentro do espelho
viajarei na linha sinuosa do horizonte
atravessarei os lindes do imponderável
largarei as amarras do viver
antes que o nada se apodere de meu ser

ARRITMIA

Equilibro-me na fronteira
Entre o tudo e o nada
Agarrada ao corrimão do tempo
Meu coração anda trôpego
Sem ritmo, sem compasso
Minha vida também anda trôpega
Cambaleando entre porquês
Não busco definições nem soluções
Tento apenas prolongar os dias

VENTANIA

Observo a ventania
Recriando nuvens em céu varrido
Espalhando incertezas vida adentro
Tecendo dores em meu peito
Penduro os anseios
Na grimpa do ingazeiro
Encerro os medos
No oco da coragem
Sinto-me forte
Para enfrentar a morte
Nos enleios do agora
Parto mundo afora
Pintando as cores do infinito
E os contornos do nada
É preciso apagar a luz
Para enxergar as trevas



*Jô Drumond (Josina Nunes Drumond) 
Membro de 3 Academias de Letras 
AFEMIL, AEL, AFESL) e do Instituto Histórico (IHGES

segunda-feira, 20 de outubro de 2014

PRECONCEITO

Por Jô Drumond

(Baseado em fato ocorrido no maranhão)
Alba se interessou por um belo rapaz afro-descendente e engatou com ele um namoro sem grandes pretensões. A cada dia descobria novas qualidades no pretendente e cada vez mais se interessava por ele. Sua mãe, bastante preconceituosa, não via aquilo com bons olhos, mas não fazia nenhuma oposição, certa de que se tratava de um namorico passageiro.
Ao perceber que o relacionamento estava ficando sério, com possibilidades de futuros desdobramentos, começou a fazer críticas veladas. Como tempo essas críticas foram se desvelando. No dia em que Alba lhe disse que pretendia se casar, a máscara da futura sogra caiu por terra.
Sem pestanejar, deu-lhe a seguinte resposta:
─ Minha filha, veja bem! Se algum dia eu estiver com um lindo netinho loiro de olhos azuis no colo, e se você chegar com um mulatinho com cabelo pimenta do reino, não pense que vou preterir o filho de sua irmã, pelo seu. Depois não diga que eu não lhe avisei.
Alba decepcionou-se com o preconceito da mãe. Bateu pé, investiu ainda mais no relacionamento e acabou se casando. Os filhos da irmã nasceram loiros de olhos claros, porém desprovidos de beleza, ariscos e chorões. Já seus filhos híbridos, com pele cor de jambo, tinham uma beleza singular, além de grande simpatia, afetividade e muita vivacidade. A avó acabou se apaixonando pelos filhos de Alba. Descobriu que café com leite dá boa mistura. Desde então, aboliu todo e qualquer resquício preconceituoso que algum dia povoara sua mente. Além do mais, tornou-se ardente defensora do hibridismo étnico.

*Jô Drumond (Josina Nunes Drumond)
Membro de 3 Academias de Letras
(AFEMIL, AEL, AFESL) e do Instituto Histórico (IHGES