Por: Jô Drumond
Oferecer uma viagem sem volta ao planeta Marte parece
brincadeira de mau gosto, mas não é. Conseguir, em pouco tempo, a inscrição
paga de duzentos mil candidatos à viagem também parece piada, mas não é.
Amplamente divulgado pela mídia, o projeto Mars One, do
holandês Bas Lansdorp, iniciado em março de 2011, é mirabolante à primeira
vista, mas aos poucos está atraindo a atenção do meio acadêmico e da sociedade
em geral, assim como o apoio de companhias aeroespaciais do mundo todo. Por
enquanto ainda se trata de um sonho, mas Lansdorp está se movimentando no
sentido de arrecadar cerca de seis bilhões de dólares para a viabilização do
projeto.
Outro holandês chamado Paul Römer, cocriador do primeiro
reality show do tipo Big Brother está aderindo à ideia de participar da escolha
dos candidatos por meio de um reality show que envolverá o mundo todo. Os
candidatos deverão enfrentar situações complexas a partir de simulações de
sobrevivência em ambiente marciano. Segundo o cronograma proposto, entre o processo
de seleção dos candidatos e o lançamento dos módulos tripulados haverá uma
década de preparo.
Muitos perigos de percurso podem se interpor aos
astronautas. Talvez eles nem consigam sobreviver aos sete meses de viagem,
devido à exposição à radiação e à microgravidade. Caso consigam chegar ao
destino, provavelmente sobreviverão por pouco tempo no ambiente inóspito do
planeta vermelho, com temperaturas abaixo de 60° centígrados. A obtenção de
água e oxigênio será complexa e poderá falhar. Partículas de gelo retiradas do
subsolo serão aquecidas. O vapor será condensado em reservatórios. Esse
processo, acrescido do nitrogênio e do argônio, filtrados da atmosfera
marciana, produzirá ar respirável para a base. Mas, em caso de imprevistos, se
houver alguma pane nesse sistema, quem garantirá a subsistência dos incautos
viajantes?
Propor-se uma aventura dessas é uma forma de candidatar-se à
morte prematura? Por que tanta gente se propõe trocar a família, os amigos, o
trabalho e os prazeres da vida terrena por uma aventura interplanetária?
Certamente há os que gostam de viver perigosamente, como
equilibristas em corda bamba. Há os que querem notoriedade, com sonhos de
pioneirismo. Há os estudiosos que vislumbram tentar na prática suas teorias
interplanetárias. Deve haver também um bando de suicidas que veem no projeto
uma maneira honrosa de dar cabo, em grande estilo, da sua enfadonha
existência. Em vez de serem considerados
covardes, de terem as exéquias fúnebres rejeitadas pela Igreja, serão vistos
como desbravadores, ou até mesmo como heróis.
As grandes invenções da humanidade muitas vezes partem de
sonhos mirabolantes. O futuro será mais auspicioso se as inovações de um
visionário sul-africano vingarem. O bilionário Elon Musk dedica sua vida e sua
fortuna a dois projetos: um mais simples, de fornecer à humanidade energia não
poluente a baixo custo e outro mais complexo, de colonizar o espaço, com o
objetivo de preservar a civilização em longo prazo. Em 2002, investiu o
montante de 1,5 bilhão de dólares para fundar a maior empresa privada de
exploração do cosmo, a Space X. Em 2012 tal empresa foi a primeira companhia
privada a atracar uma sonda na estação Espacial Internacional. Segundo
declarou, ele acordou certo dia, às duas da madrugada, com uma solução viável
para viagens interplanetárias: foguetes movidos a metano e oxigênio podem
atingir um impulso de 3,8 quilômetros por segundo, o que é suficiente para
chegar a Marte. Uma vez lá, é possível converter elementos existentes in loco,
o dióxido de carbono (CO2) e o permafrost (H2O - solo congelado com abundância
de água) em metano (CH4) e oxigênio líquido (O2), para garantir o retorno à
Terra.
Nossos avós nunca imaginaram que seus netos, um dia,
pudessem assistir à chegada do homem à Lua, pela televisão. Naquela época não
existia televisor, nem iluminação pública. Thomas Edson, um dos precursores da
revolução tecnológica, morto em 1931, foi o primeiro a construir a lâmpada
incandescente, capaz de transformar energia elétrica em energia luminosa.
Pode ser que, no futuro, as viagens interplanetárias se
tornem corriqueiras para nossos descendentes. Apesar da rápida evolução
tecnológica, talvez não estejamos mais aqui para presenciar mais esse grande
passo rumo às estrelas.
*Jô Drumond (Josina Nunes Drumond)
Membro de 3
Academias de Letras
(AFEMIL, AEL,
AFESL) e do
Instituto Histórico (IHGES