*Jô Drumond
José Oswaldo dos Santos, vulgo
Brasinha, conhecido também como Embaixador Cultural do Sertão, é membro da
Academia Cordisburguense de Letras e grande conhecedor da obra de Guimarães
Rosa. O apelido Brasinha se deve a estripulias de infância. Estando sempre irrequieto
na carteira escolar, os colegas diziam que havia uma brasinha sobre seu
assento.
Trata-se de um senhor de
meia-idade, falante, sorridente, comunicativo, com belíssimos olhos azuis, cujo
brilho se torna mais intenso se o assunto for a obra de Guimarães Rosa. É
parente do escritor, pelo lado da família Rosa. Dedica-se à literatura, mas
garante seu “ganha pão” com o comércio.
É proprietário de dois estabelecimentos
comerciais, sendo um deles singular, talvez único no gênero, chamado Ave
Palavra. Ali há “de um tudo”, mas não se vende quase nada. Sem pretensão
comercial, a loja Ave Palavra, título de uma obra póstuma de GR, é a menina dos
olhos do proprietário. Sempre em seu estabelecimento predileto, Brasinha recebe
todos os aficionados da obra Roseana, com largo sorriso e muita simpatia.
Tal
loja é um verdadeiro bric-à-brac, como dizem os franceses, ou seja, um
amontoado das mais variadas coisas, sejam elas antigas, novas ou usadas. Nas
prateleiras, há diversas coleções de objetos antigos. É impossível abarcar tudo
com o olhar. O cliente se surpreende a cada momento. Para um forasteiro
desavisado, aquilo não passa de quinquilharias, mas para Brasinha são objetos
muito importantes, de grande valor afetivo. Cada um tem sua história. Apesar de
não estarem à venda, há alguns souvenirs à disposição dos turistas, como
camisetas e bordados típicos da região.
Entrei casualmente em sua loja,
com algumas colegas, e acabamos ficando por lá uma tarde toda a ouvir os
“causos” de Brasinha. Ele é uma pessoa incrivelmente ligada não apenas à
literatura Roseana, mas à história de Cordisburgo.
Numa parede lateral interna, há um
grande banner colorido, de cerca de 3 metros de comprimento por um metro de
altura, contendo a foto de uma vereda, ou seja, de um lugar embrejado, pantanoso,
cheio de palmeiras buritis. No fundo da loja, vê-se uma porta, com uma cortina
bizarra, de plástico branco e grosso, bem resistente, com dizeres enormes “SÃO
JOSÉ, LEVAI NOSSOS PEDIDOS AO PAI”. Pensei que o proprietário fosse muito
religioso. Qual nada! Brasinha contou-me a história da pretensa cortina.
Segundo ele, certo dia, um vaqueiro saiu à procura de uma vaca desgarrada e avistou, no alto de uma serra, um vulto branco. Aproximou-se pensando que se tratava da vaca e encontrou, caída sobre a relva e presa a um monte de balões, a faixa dirigida a São José. O autor de tal façanha decidira enviar uma mensagem visual diretamente aos céus. Pode-se inferir que, no seu entender, o céu apregoado pela religião cristã, se encontra realmente sobre nossas cabeças, e que, São José, mesmo sem nunca ter aprendido a língua portuguesa, consiga ler sua mensagem. Causos como esse, só mesmo na terra de Rosa.
Segundo ele, certo dia, um vaqueiro saiu à procura de uma vaca desgarrada e avistou, no alto de uma serra, um vulto branco. Aproximou-se pensando que se tratava da vaca e encontrou, caída sobre a relva e presa a um monte de balões, a faixa dirigida a São José. O autor de tal façanha decidira enviar uma mensagem visual diretamente aos céus. Pode-se inferir que, no seu entender, o céu apregoado pela religião cristã, se encontra realmente sobre nossas cabeças, e que, São José, mesmo sem nunca ter aprendido a língua portuguesa, consiga ler sua mensagem. Causos como esse, só mesmo na terra de Rosa.
Na parede lateral de Ave Palavra,
que dá para a esquina, lêem-se duas frases roseanas:
“Cordisburgo é o lugar mais
formoso devido ao ar e ao céu, e pelo arranjo que Deus caprichou em seus morros
e suas vargens. Por isso mesmo, lá, de primeiro, se chamou visa alegre”.
“...quando escrevo sempre me sinto
transportado para este mundo. Cordisburgo”
No alto da fachada lê-se, em
letras garrafais: AQUI JÁ É O SERTÃO. Logo abaixo, vê-se o nome da loja em
grandes letras: AVE PALAVRA. As duas portas de entrada são ladeadas por uma
série de transcrições de neologismos roseanos, a saber;
Seguem abaixo, a quem interessar
possa, alguns itens dos quais me lembro, vistos nas prateleiras de Brasinha, em
2010:
Comprei alguns souvenirs contendo
citações Roseanas, entre eles uma plaquinha de madeira, que diz: “ser mineiro é
mudar por fora e ficar o mesmo por dentro”; um pequeno painel para dependurar,
no qual há a figura de um ursinho depressivo, tapando a carinha com as patinhas
e a frase de Rosa: “Inútil fugir, inútil resistir, inútil tudo”. Comprei também
camisetas com motivos da obra Grande sertão: veredas e um caminho de mesa
bordado, no qual se lê: “um bom amigo é melhor do que uma boa carabina”.
Além de Brasinha, tive o
privilégio de conhecer outras pessoas singulares, que certamente fariam parte
do grande elenco de personagens do autor de Grande sertão: veredas, se este
ainda estivesse entre nós.
Jô Drumond (Josina Nunes Drumond) Membro de 3 Academias. de Letras (AFEMIL, AEL, AFESL) e do Instituto Histórico (IHGES)