sábado, 13 de abril de 2013

FANTASIA DE UMA MOÇOILA TÍMIDA


                                                                                                                *Jô Drumond

Aos treze anos, muito magricela, eu morria de inveja das coleguinhas da mesma idade, já com suas protuberâncias empinadas a despontar sob a blusa do uniforme escolar, empurrando o fustão branco e forçando as casas dos botões.
Certo dia, toda acanhada, entrei numa lojinha de turcos, com a firme intenção de comprar um sutiã. Fui atendida por um senhor bigodudo, certamente o proprietário. Inventei uma desculpa, dei meia-volta e saí. Naquela época ainda não havia lojas específicas para roupas íntimas. A única opção seria tentar encontrar a peça desejada numa das diversas lojas de turcos, próximo à antiga rodoviária de Patos de Minas. Depois de várias tentativas, fui finalmente atendida por uma balconista. Pedi um sutiã nº 42, bem maior que minha ousadia. O menor deles, de nº 38, ficava enorme em mim. O ideal seria o tamanho “menina-moça”, mas eu não queria saber daquela coisinha insignificante. Comprei um grandão, pontudo, recheado de espuma, como se usava na época. À noitinha, paramentada para o tradicional cinema domingueiro, lá fui eu, de ombros levantados, na tentativa de exibir o falso atributo sob meu vestido estampado.
Ao sair do cine Riviera com as coleguinhas, fui abordada por um charmoso mancebo que se mostrou interessado em me conhecer. Perguntou-me se podíamos caminhar um pouco juntos, para prosear. Isso jamais havia acontecido. Aluna de colégio feminino, eu nunca tinha tido oportunidade de conversar a sós com um garoto que não fosse da família. Por que razão ele teria se interessado justo por mim? Éramos três, todas da mesma idade. Embora ainda criançola, eu me sentia verdadeira mocinha naquele dia. Pela primeira vez, me fiz notar pelo sexo oposto. Andamos lado a lado, tendo as duas colegas na retaguarda, com ouvidos esticados ao máximo, numa vigilância tão próxima que quase pisavam em nossos calcanhares. Voltei para casa radiante. Naquela noite tive sonhos coloridos, cheios de mistérios e galanteios.
Na manhã seguinte, enfiei-me no uniforme escolar e fui para a Escola Normal, com uma alegria contida. Invadiu-me uma sensação bizarra, que nunca havia experimentado. Comecei a imaginar uma infinidade de histórias em torno daquele pretendente meio mítico, do qual mal sabia o nome. Após as aulas, eu voltava tranquilamente para casa, acompanhada das colegas quando o vi, numa dobra de esquina, recostado ao muro, à espera de nossa passagem. O inesperado encontro deixou-me em maus lençóis, sem o devido atributo das moçoilas, usado na noite anterior. Coloquei a pasta escolar sobre a blusinha de fustão, e abracei-me a ela, para dissimular minha criancice. Não poderia nem mesmo estender o braço para um eventual cumprimento. Saudei o garoto de longe, com um simples “oi”, acompanhado de um “friozinho” na barriga.
Continuei meu caminho matutando o que faria doravante para manter o simulacro da mocinha peituda. Eu não poderia frequentar as aulas usando sutiã; seria motivo de troça de toda a turma. Por outro lado, não poderia sair à rua sem o adereço, para não decair ao rol da infância. Despistar minha mãe para o uso do sutiã nos passeios noturnos seria fácil. Sempre atarefada com seus afazeres, ela não perceberia meu estratagema pubescente, mas, como despistar o pretendente, sob a luz do sol, na volta do colégio?
Nos dias subsequentes, temendo eventuais imprevistos, pedia a alguém para examinar o entorno do colégio. Quando a área estava livre, eu saia rapidamente e mudava de itinerário a cada dia, sempre abraçada à pasta.
À noite, eu me desabrochava. Maquilada e fantasiada de gente grande, saía de casa toda serelepe para o footing na Av. Major Gote com as colegas. Andávamos tímidas e faceiras de braços dados, pra lá e pra cá, no quarteirão entre o bar Fla-Flu e a Sociedade Recreativa Patense. Sentíamo-nos o foco de todas as atenções, o centro do universo.
Um mundo desconhecido se descortinava para aquelas garotinhas vaidosas e ingênuas, que ainda não conheciam nada da vida. Bons tempos, aqueles!

*Jô Drumond é membro da: 
AEL (Academia Espírito-santense de Letras)
AFESL (Academia Feminina Espírito-santense de Letras)
AFEMIL (Academia Feminina Mineira de Letras)
IHGES (Instituto Histórico e Geográfico do ES)