“Imagino que em algum lugar do mundo há alguém que neste momento remexe, por acaso, uma gaveta qualquer, encontra uma velha carta minha, passa os olhos por curiosidade no que escrevi, hesita um instante em rasgar, e depois a devolve à gaveta com um gesto de displicência, pensando, talvez: é mesmo, esse sujeito onde andará? Eu nem me lembrava mais dele...” (da crônica “Velhas cartas” – 1953 - de Rubem Braga)
Numa época não muito remota não havia energia elétrica, rádio, nem telefone. O telégrafo era o mais moderno meio de comunicação. Nas cidades interioranas, sem circulação de jornais, as notícias chegavam pelos correios e eram repassadas de boca em boca. Novidades de entes queridos, distantes no espaço, só por meio de cartas. A figura do carteiro era de grande relevância. A expectativa de sua chegada era mesclada de alegria, de inquietude e até mesmo de aflição. Sua passagem de porta em porta deixava um rastro díspar de júbilo, melancolia, amargura, e, em casos notícias fúnebres, choro, desespero e luto.
Não havendo campainha, nem interfone, o carteiro entoava em bom tom o nome do destinatário à porta de seu domicílio, como registra o samba canção “Mensagem”, de Álvaro Cabral e Cícero Nunes: “Quando o carteiro chegou / E meu nome gritou / Com uma carta na mão/ Ante surpresa tão rude / Nem sei como pude / Chegar ao portão...”
Não havendo campainha, nem interfone, o carteiro entoava em bom tom o nome do destinatário à porta de seu domicílio, como registra o samba canção “Mensagem”, de Álvaro Cabral e Cícero Nunes: “Quando o carteiro chegou / E meu nome gritou / Com uma carta na mão/ Ante surpresa tão rude / Nem sei como pude / Chegar ao portão...”
Atualizando a citação do velho Braga, imagino que em algum lugar do mundo há alguém que neste momento clica, por acaso, na caixa de mensagens, encontra um e-mail meu, passa os olhos por curiosidade no que escrevi, hesita um instante em deletar, e decide deixá-lo ali por mais algum tempo com um gesto de displicência, pensando, talvez: é mesmo, esse sujeito onde andará? Eu nem me lembrava mais dele...
Cada um de nós morre um pouco quando alguém, na distância e no tempo, rasga alguma carta ou deleta alguma mensagem nossa.
Jô Drumond
Escritora, Membro da Academia Feminina Mineira de Letras,
Membro da Academia Feminina Espírito-santense de Letras
e "Membro do Instituto Histórico e Geográfico do ES".